domingo, 22 de novembro de 2009

AFEMIL- Discurso de Posse-Clevane Pessoa-Cadeira 05-Cecília Meireles


Cecília meireles, óleo
o de Arpad Szenes.A tela chama-se "Poesia".E ela o foi, por inteiro, a própria Poesia...


Numa das tempestades de outubro, a energia acaba e escrevo à luz de velas...



Belo Horizonte, novembro de 2009-11-17
Desenho de meu rosto.Foto de Eloá,em Brusque, Santa Catarina, III Jogos Florais,novembro de 2008, logo após minha eleição pra a AFEMIL.

Discurso de Posse, Cadeira 05, Cecília Meireles


Sra.Presidenta da Academia Feminina Mineira de Letras, Conceição Abritta[em viagem , na data de 18/11,para os I Juegos Florales el Caribe, foi reresentada por Elizabeth Rennó], Presidentes Beneméritas, Acadêmicas, Autoridades e Amigos presentes.

À frente das pessoas que aqui se encontram,estou na posição de quem assume um compromisso de alma e de razão.Com imensa alegria, há um ano, soube por minha amiga a Acadêmica Ângela Togeiro, Cadeira Anita Garibaldi, que fora eleita para a Cadeira número 05, Cecília Meireles - através de um telefonema.Cantou-me o coração em júbilo porque durante toda a vida, a poeta esteve presente em minha vida de menina declamadora, de professorinha normalista, de literata, de resenhista, de jornalista, de psicóloga, em ludoterapia e psicoterapia, sempre cita em palestras, conferências, workshops-mas sobretudo, esteve presente em minhas leituras, para meu deleite .

Quero agradecer às pessoas que votaram em meu nome, certamente mui influenciadas pelo discurso detalhado sobre mim escrito por Ângela Togeiro-do qual gostei tanto que ele está presente em um de meus livros, publicado logo depois , chamado Olhares, Teares, Saberes-“A Poética do Olhar”, escolhido pelo editor, o poeta catarinese radicado no Maranhão Kiko Consulin, quando o mandei para seu conhecimento.A ela, dedicada e delicada, agradeço de forma especial.Agradeço também à Acadêmica Maria Laura Couy que recebeu-me com a consistência necessária a uma Presidente e ainda ,a Maria Conceição Abritta, atual Presidente desta casa, a quem conheci quando fui apresentar-me da UBR/BH .Gostaria no entanto de lembrar um nome especial para minha presença da AFEMIL: a Acadêmica Elizabeth Rennó .Certa feita, indo à Universidade Livre, fui assistir a cita Conceição palestrar sobre Florbela Espanca e Cely Vilhena sobre Sophia de Mello Breyner,poetas portuguesas , apresentadas de forma magnífica.

Após as falas, apresentei-me a Elizabeth e presenteei-a com alguns exemplares de meus livros.

Pouco tempo depois, ela telefonou-me e convidou-me para Acadêmica benemérita desta Casa.Aceitei, mas por motivos de foro íntimo,inclusive um luto, acabei por não tomar concluir a possibilidade de estar em convívio com vocês há mais tempo.. .Graças à tenacidade de Ângela Togeiro, acabei por concorrer e aqui estou.Conheço várias das acadêmicas pessoalemente e outras pela obra, inclusive muitas tiveram poemas impressos no evento Paz e Poesia ,que organizamos com os Poetas Pela Paz e pela Poesia , distribuídos a nível mundial.

Agradeço a meus filhos e noras, aos amigos presentes e à presença a nível afetivo de memória, de meus pais, que sempre incentivaram minha carreira e o desenvolvimento de meus dons.Minha mãe treinou-me a declamação e meu pai comprou todos os livros que desejei.A meu avô maestro, de quem herdei o ritmo , certamente um bom auxiliar da métrica e a meu avô jornalista , que , de forma lúdica, a ensinou para que eu começasse a escrever Poesia de forma clássica. Mais tarde, liberta de quaisquer amarras, transitei livremente por todos os gêneros literários.

Ainda quero agradecer ao Jornalista Wilson Miranda, Presidente da AMI_Associação Minira de Imprensa, por haver recentemente me convidado a integrar a Comissão de Cultura da casa, na qualidade de Consultora de Cultura.
Ele nos abre as portas e , em espcial, o auditório, a saraus, recitais de música ou Poesia, Teatro, Dança...

Espero em breve poder desenvolver para vocês, uma palestra sobre a esplendorosa trajetória poética de Cecília Meireles.Hoje, porém , pincelarei apenas alguns pontos , para que a melhor possamos senti-la aqui entre nós, nesse espaço onde o feminino irmana-se às Letras, e a palavra plana por entre o ser da mulher, das mulheres que cada uma de nós representa.Desde tempos imemoriais, as mulheres costumam reunir-se para trocar e somar.Do coletar ervas para chás e medicina caseira, dos bordados às receitas, das confidências aos partos .E, numa academia, a entretecer a suave trama de sua fortaleza , encantamento e criatividade, mesmo quando o verso, a prosa, têm um dedo acusatório ou tomam foto de denúncia social e, sobretudo a falar de amor,
Na plenitude de almas muito amplas para recolhê-lo onde quer que esteja, ou na aba do avental, ou no côncavo das mãos hábeis, ou no crochetar da poesia , no tricotar do verbo...Mulheres que escrevem, pássaros flores, borboletas ou panteras, peculiares e marcantes, femininas , mas capazes de escrever tudo aquilo que desejam.

Então, chamo minha patrona, para reapresentá-la, mesmo sendo tão conhecida.


Cecília Meireles, como eu , de ascendência portuguesa, tanto nasce , quanto passa a outra dimensão no mês de novembro.Vem à luz dia 07, em 1901, e parte dia 09,em 1964, logo depois de completar 63 anos.Depois de uma vida intensa e prolífera na Literatura , na arte, na Educação.

Seu pai , Carlos Alberto de Carvalho Meireles, faleceu três meses antes de seu nascimento .A mãe , Matilde Benevides, que perdera outros filhos, Vítor, Carlos e Carmen, vai-se quando ela era muito pequena .A avó, D. Jacinta Garcia Benevides, portuguesa de Açores, passa a criar a neta.

Cecília Benevides de Carvalho Meireles, que nascera na Tijuca, depois descreve de que forma as perdas a influenciaram:

"Nasci aqui mesmo no Rio de Janeiro, três meses depois da morte de meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas, ao mesmo tempo, me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a Morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o Eterno.”

Ou:

“Minha infância de menina sozinha deu-me duas coisas que parecem negativas, e foram sempre positivas para mim: silêncio e solidão. Essa foi sempre a área de minha vida. Área mágica, onde os caleidoscópios inventaram fabulosos mundos geométricos, onde os relógios revelaram o segredo do seu mecanismo, e as bonecas o jogo do seu olhar. Mais tarde foi nessa área que os livros se abriram, e deixaram sair suas realidades e seus sonhos, em combinação tão harmoniosa que até hoje não compreendo como se possa estabelecer uma separação entre esses dois tempos de vida, unidos como os fios de um pano."

O convívio com a avó açoriana dota a menina com duas pátrias referenciais:nasce e vive no Brasil, mas conhece as histórias, poesia, canções e costumes da terra lusa, que ama igualmente .E, mais tarde, ao casar-se 1922,com o artista português Fernando Dias Correia estreita ainda mais essa dupla nacionalidade, que se não de lei, existia de fato.Com ele, tem suas três filhas, Maria Elvira, Maria Matilde e Maria Fernanda- esta, a conhecida atriz brasileira.

Aos nove, Cecília começa a escrever poemas e aos dezoito, publica Espectros(1919),de poemas considerados de inflluência simbolista, onde canta personagens históricos e notáveis, Cleópatra, Joana D”Arc, Maria Antonieta, alguns bíblicos, quais Judite,Sandão e Dalila,Jpão Batista, Reis Magos e Cristo, por exemplo, mostrando o quantos seu jovem imaginário poderia ir longe ao poetizá-los.

Depois, em Portugal, vem a lume “O Espírito Vitorioso”, um ensaio onde entretece uma apologia ao simbolismo.

Depois, não pára mais,de publicar, escrever, o que nos impressiona visto que as mulheres não tinham tanto espaço à sua época.

Cria a primeira Biblioteca Infantil brasileira, no Pavilhão Mourisco, e o marido, que frequentemente usava o perfil da esposa em seus trabalhos, decora de forma feérica e alegre esse espaço destinado às crianças-Aliás, em Poesia infantil, Cecília

Correia Dias deprimido com a difícil condição de ser artista visual, suicida-se em 1935. Mais uma vez, a morte a ronda e ela passa a lutar muita para manter as filhas.Cinco anos depois, Cecília casa-se, em 1940, com o professor e engenheiro agrônomo Heitor Vinícius da Silveira Grilo.

Essa pessoa à frente se seu tempo, que passou grande parte de sua vida viajando e escrevendo poesia por onde passou, de Portugal à Índia, tem uma biblioteca que leva seu nome, no Chile, em Valparaíso, inaugurada em 1964.No Brasil e em Portugal, vários logradouros e salões levam seu nome.

O grande crítico Paulo Ronai considera que o lirismo ceciliano “é o mais elevado da moderna poesia de língua portuguesa.nenhum outro poeta iguala o seu desprendimento, a sua fluidez, o seu poder transfigurador, a sua simplicidade e seu preciosismo, porque Cecília só ela, se acerca da nossa poesia primitiva e do lirismo espontâneo...A poesia de Cecília Meireles é uma das mais puras ,belas e válidas manifestações da literatura contemporânea”.

Creio que eu mesma poderia ter dito algo similar, pois a leio e releio desde sempre, mas é bom que tal afirmativa e análise tenha partido de um homem, reconhecimento do empoderamento feminino de alguém que nasceu para cumprir essa missão de poetizar tanto, tudo e todos.Ela nos abriu , a nós mulheres que escrevemos poesias, portas, portais, espaços, com um senso de realidade forte, mas parecendo flutuar qual uma figura apaixonada e apaixonante de Marc Chagall, no entorno de nossa leitura, de nossa interpretação e olhar .

De Cecília Meireles, quando eu morava em Juiz de Fora e trabalhava na Gazeta Comercial, chegavam-me livros , que eu relia e relia.No ano de 2001, ganhei de Natal,
Os dois volumes gigantescos de “Cecília Meireles-POESIA COMPLETA”-
organizados por Antonio Carlos Secchin,que saem pela editora Nova Fronteira, trabalho de fôlego, que não deixa fora nem os inéditos da autora. A apresentação é dele, com notícia biográfica de Eliane Zagury.Traz desenho e tela de Arpad Szenes, com a poeta , cujo autoretrato vem na capa-ela também é desenhista- e muitas fotos de Cecília e intelectuais da época, avós, pais, uma festa para nosso olhar curioso.

Um de seus pequenos grandes poemas dos quais mais gosto :

4o. Motivo da rosa


Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.


Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.


Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.


E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim
.”

E para ela, escrevi, enfeixando os títulos de seus livros num oloroso buquê:


A Cecília - e Seus Livros

Clevane Pessoa

Sempre dançaste, minha Cecília,
ao sabor dos quatro elementos,
nas quatro estações do tempo...
Entre doces "Espectros"
que te povoaram a Vida,
ouviste o corvo de Poe anunciar cada "Nunca mais"
e o tranformaste em "Poema dos Poemas ".


Na casa dos vinte, dama intimorata ,produziste "Baladas para El Rei"
depois, quase aos trinta anos, fizeste uma
"Saudação à Menina de Portugal...
Convidaste a bailar,a seguir com rodopiante "Festa das Letras"!
Vestida em casaco de estrelas, em uma rica "Viagem",
tornaste consistente tua carreira de sol.

Sob o signos das águas, da feminilidade, dos sonhos e etéreas nuances,
encantaste com rua "Vaga Música" transcendental,
mesmo se abordasses temas cotidianos e simples.
Mergulhaste, pássaro marinho, no teu "Mar Absoluto", qual a cor de teus olhos d'água.
Muitos artistas fizeram teus retratos e tu mesma,
um portrait de teu rosto alegre-triste: sempre um "Retrato Natural"
de quem não usava máscaras-exceto as POIESIS...

Entretecestes leves tramas no "Amor em Leonoreneta",mostraste
as emoções nuas em em "Doze Noturnos da Holanda & O Aeronauta",
e perquisaste cada passo/verso para o o magnífico "Romanceiro da Inconfidência"
e aclaras, en/cantas, no "Pequeno Oratório de Santa Clara"
no mesmo ano de "Pistóia" e "Espelho Cego"-que talvez tenha guardado tua antiga face...
Volteias em "Canções" e poetizas tua onomástica ,no "Romance de Santa Cecília"
qual ela, deves seguir ouvindo anjos...
Alquimista, crias um "Metal Rosicler", e depois escreves teus "Poemas escritos na Índia",
doce viajeira de "Solombra"...Sempre apontas para "Ou isto ou Aquilo", tudo que conheces
é sim ou não, perdas e ganhos, desejos...E então, se fazes a "Crônica Trovada da Cidade de Sam Sedastiam"
logo te dedicas aos "Poemas Italianos", tracejas sentimentos em "Morena, pena de Amor"
e te derramas inteira pelo filtro dos teus "Sonhos"...
A andarilha das estrelas e das flores novamente revela olhares em "Poemas de Viagens",
a alma de desenhista demonstrada nos versos ágeis e levíssimos.
Intriga-te "O Estudante Empírico"e rumorejas, gloriosa, em teus "Cânticos"
e então, espiritual trancendes no "Oratório Santa Maria Egipcíaca"...

Reempetalas A Rosa, " Flor de Poemas, em suaves mas filosóficas "Elegias"
-e entre "Flores e Canções" chegas aos "Verdes Reinos Encantados"
com tua alma olorosa e luso/brasileira...

Belo Horiozonte, 16 de novembro de 2009.

Posse na cadeira 05, Cecília Meirelles,em novembro/2009,
eleita em nov 2008.

Obrigada a todos pela paciência de ouvir-me e estar comigo nesta data tão importante para minha vida .


(Cecília Meirelles nasceu e morreu neste mês de novembro

*07/11/1901 + 09/11/1964)



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Busco amigos verdadeiros , qual o mergulhador em águas profundas, busca a melhores ostras para achar a pérola.O que resta, pode ser lindo qual o abalon, o nácar,a madrepérola, mas jamais terá o mesmo valor...Clevane Pessoa

Data da posse:18 de novembro de 2009

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